sábado, 23 de junho de 2018
Piúma entre versos e prosas
A praia que era tão bela
Asfaltaram.
O mar veio e pegou de volta
Mesmo com tanta sequela
Cadê o mangue?
A restinga? Foi-se também
A responsabilidade?
É de “ninguém”
Sem preocupação com a natureza
O lixo na areia da praia
Que eu andava na praia sem ânsia
Brincava de bike, de pique,
Andava a pé, nadava no rio,
No mar, a cavalo e no caíque.
Do tempo que eu era criança
É triste ver menino crescer
Nesse jeito novo de viver
Sem saber o que é caminhar
Até o monte Aghá.
Senão começarmos a mudança
Vamos ter adultos sem herança
Com ausência de infância
O “turismo” e o “progresso” desenfreados
Destroem o que horas dantes foi sonhado
Geram graves consequências
Padecer por falta de consciência
Fazer o que?
Tanta ignorância, pra que? Por quê?
Sem chance, adeus praia, adeus mangue, haja sofrência, adeus
restinga, que míngua!
A pé? Nunca mais até a ilha dos cabritos.
“Você acha que a gramática tem que apanhar todos os dias para saber quem é que manda?”
“Você acha que a gramática tem que apanhar todos os dias para saber quem é que manda?”
Talvez!
Talvez, por ignorância, por displicência, por apatia ao
longo de um período da minha existência eu compreendi
erroneamente que o correto fosse somente
utilizar a gramática ao “pé da letra”, não percebendo que às vezes ela era obsoleta, ultrapassada, e desdenhando o que me era intrínseco passei a não ouvir, a não escutar a minha raiz, a minha “minerês”, fato que me deixou perder por um bom tempo o gume, a sensibilidade, ferindo uma parte da trajetória da minha carreira profissional, por diversas vezes vi-me criticando através de um olhar parvo para quem não obteve o mesmo conhecimento e aprendizagem educacional que eu. Não compreendia apesar de fazer parte do meu dia a dia, o falar diferente, os pecados gramaticais. Talvez por achar que o aprender e conhecer uma língua com suas características, suas normas, me enriqueceria mais permitindo argumentos por vezes autoritários, fazendo-me proprietária da verdade, tornando-me ditadora da linguagem. O pior que para mim era imperceptível, apesar de não ser uma profissional em português, eu só enxergava a importância de comunicar através da gramática.
Nas Minas Gerais, nos bancos das escolas onde estudei, repassaram-me o português com todas as suas regras, a gramática correta, portanto falo “nóis”, mas escrevo, nós. Em casa desde criança o contato com os meus era uma linguagem diferenciada, entre “uais, cê, acódieu, pertin, trem, arréda, blusdifri, bão”¹ eu vivi, eu falava, mas não percebia o quão nossa linguagem era rica, distinta, o “minerês” é um dialeto. Como curiosidade é válido lembrar que existe uma versão que essa nossa oralidade, essa forma de falar do mineiro é do tempo dos inconfidentes para dificultar o entendimento dos espiões que eram contra a inconfidência mineira.
Lamentavelmente o que percebo é que quanto mais adquirimos conhecimentos mais prepotentes e donos de um ego abastardo nos tornamos, quanto mais sabemos, mais menosprezamos os que acreditamos que menos saibam, os que não tiveram o mesmo patamar educacional tal qual ou maior que o nosso, sentindo-nos proprietários da linguagem, onde o que sei, não cabe mais aprender.
Compreendo que apesar da escola desapropriar-me do uso da linguagem que me pertencia, o estar letrado, o uso da gramatica, não me fez perder a essência que eu tive da comunicação com os meus pares e entes passados, através das músicas, dos sentimentos, das brincadeiras, das falas, das historias contadas muitas vezes ao relento em acampamentos na beira do rio, na fazenda, na beira do fogão a lenha. O legado, os valores deixados pelos meus pais, tios, avós é uma bagagem positiva na minha aprendizagem e na comunicação tendo como relevância o silêncio, o observar, o perceber, o absorver, o inculcar, o questionar e sei que todos esses parâmetros fizeram e fazem parte do meu crescimento enquanto sujeito social. O meu processo de empoderamento acentuou-se mais após ler, escrever e discutir nos encontros presenciais no Polo de Piúma da UAB/UFES, com os conteúdos das disciplinas do curso de Pedagogia, onde passei a compreender a diferença entre ser professor e ser instrutor, fato que me alçou a perceber o quão era importante a absorção, o entendimento de que a gramatica é uma forma de comunicação, não desdenhando sua importância, mas compreendendo que comunicar é variante, a partir desse insight² me remontei. E passei a ouvir mais, a perceber mais, a sensibilizar mais, a incluir mais, a emancipar mais.
Acredito que a gramática é relevante em momentos oportunos, mas precisa apanhar de vez em quando, para saber que nós a criamos e temos o domínio, o controle, para intervir e interferir quando acharmos que há necessidade de mudanças, por evolução, quando ela tornar-se obsoleta, incomunicável.
¹Uai - Porque, como assim, hein. Cê – Você. Acódieu - Me socorre. Pertim – pertinho. Trem - qualquer coisa menos o trem de ferro. Arréda - encosta ai , chega para lá por favor. Blusdifri - blusa de frio. Bão - tudo bom.
Insight ² clareza súbita na mente, no intelecto de um indivíduo; iluminação, estalo, luz.
Rosilene H. Guilherme 23/06/2018
Referências
As referências são os quatro anos de leitura, discussões, aprendizagem do curso de Pedagogia, a minha família, meus pares, meu meio.
FILHO, J.F.F. Linguagem V Capítulos I, II, III, IV, V, VI - (RE) visita aos conceitos basilares para uma maior compreensão do ensino da linguagem - Dissertação capítulo 6.
VERISSIMO, Luis Fernando. O gigolô das palavras. In: ______. Para gostar de ler; Luis Fernando Verissimo: o nariz e outras crônicas. 10 a. ed. v. 14. São Paulo: Ática, 2002. p. 77 e 78.
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